7/30/2021

Entrevista EcoMovimento: “Estamos a reforçar a atenção ao setor doméstico, porque é uma necessidade de todos os portugueses – ter um local onde possam entregar os seus resíduos para que sejam devidamente tratados”

 

Fundada, em 2011, na cidade de Guimarães, a EcoMovimento é uma empresa especializada em operação e gestão de resíduos, nomeadamente, de óleos alimentares usados (OAU), refinando-os e encaminhando-os para a indústria do biocombustível.

Falámos com Hugo Rocha, gerente, para perceber melhor o seu papel na indústria e no setor dos resíduos e biocombustíveis e qual a sua ambição.

 

Como surgiu a EcoMovimento e quais são as suas motivações e o seu propósito?

A EcoMovimento surgiu há 10 anos na sequência de um projeto de inovação que pretendia transformar a glicerina bruta (um subproduto da produção de Biodiesel) em detergentes. O projeto foi desenvolvido pela empresa Mãe da EcoMovimento, a Representações Júlia Rocha, que atua no setor dos produtos auxiliares para lavandarias e tinturarias industriais, em parceria com a Universidade do Minho. Deste projeto nasce a EcoMovimento e a sua relação com os óleos alimentares usados e com a indústria produtora de biocombustíveis de resíduos e outros avançados.

Numa primeira fase, equacionámos a possibilidade de criar uma rede de recolha e reciclagem de óleos alimentares e uma unidade de produção de biodiesel e, assim, conseguir cobrir todo o processo, mas cedo percebemos que o melhor para a empresa seria especializarmo-nos na primeira parte do processo.

 

Consegue explicar-nos a vossa atividade de “Operação e Gestão de Resíduos”?

A operação e gestão de resíduos é a atividade de receber e tratar os resíduos que nos chegam, da melhor forma, para que não acabem nos sítios errados, danificando os ecossistemas. Isto é, enquanto o trabalho dos cidadãos é reciclar os resíduos, colocando os óleos alimentares usados nos oleões, o nosso trabalho é proporcionar aos cidadãos a possibilidade de terem oleões perto de si e, posteriormente, recolher os OAU, tratá-los e fazê-los chegar às fábricas de biocombustíveis.

A recolha de OAU é feita pela EcoMovimento? Em que locais do país?

Na vertente de recolha direta, estamos presentes em oito distritos no Norte do país. Estamos localizados na cidade berço da nação, em Guimarães, e fazemos recolha direta de óleos alimentares usados nos distritos de Braga, Viana do Castelo, Porto, Aveiro, Vila Real, Bragança, Guarda e Viseu.

Além destes, estamos presentes um pouco por toda a parte em Portugal Continental e Ilhas, através de parcerias que temos com outras empresas que trazem o resíduo até às instalações da EcoMovimento.

 

Além da recolha de OAU, que outros projetos/iniciativas tem a EcoMovimento para sensibilizar a população para a necessidade de melhor gerir os resíduos que produzimos?

Temos vários projetos de sensibilização ambiental direta e indireta, ou seja, que não dizem respeito, somente, aos óleos alimentares usados. Para isso atuamos em duas frentes. Por um lado, através das nossas redes sociais, nas quais consciencializamos os nossos públicos da necessidade de reciclagem e, por outro lado, junto das escolas, através de iniciativas que incentivem e expliquem a necessidade de reciclar óleos alimentares usados e todas as outras tipologias de resíduos.

 

Qual é a ambição de crescimento da EcoMovimento?

Na EcoMovimento, não temos um medidor só para a ambição de crescimento, nem temos forma de fazer essa medição, nem de determinar uma altura no tempo, mas sabemos que acontecerá naturalmente.

Se olharmos para este ponto ao contrário e pensarmos no motivo pelo qual crescemos nos últimos 10 anos, a verdade é que crescemos pelas necessidades e desafios que o mercado nos foi lançando. Foram eles que nos forçaram a crescer através da restruturação de algumas formas de trabalhar, da adaptação dos recursos humanos, logísticos e da melhoria das infraestruturas. E assim deve ser, também, na próxima década.

 

Qual o impacto da EcoMovimento no ano de 2020?

No ano de 2020, processámos 815 mil litros de óleo alimentar usado. Isto é, entrou e saiu a mesma quantidade para a indústria da produção de biocombustíveis.

Este ano, apenas no primeiro semestre de 2021, já processámos 550 mil litros. Por isso, se tudo se mantiver, prevemos processar mais de 1 milhão de litros de óleos alimentares usados em 2021, o que significaria um crescimento de volume de processamento de 30%.  

 

Como é que a EcoMovimento olha para esta indústria em Portugal?

O que vemos na indústria de tratamento de resíduos, nomeadamente no processamento de óleos alimentares usados, em Portugal, é um conjunto de empresas muito relevantes do ponto de vista dos recursos humanos, das infraestruturas e das condições logísticas. Vemos empresas muito capazes de dar resposta à quantidade de matéria-prima que é produzida em Portugal.

Contudo, esta indústria não está a utilizar a sua capacidade máxima, devido ao que consideramos ser o maior desafio deste setor, o de chegar aos cidadãos. Enquanto as atividades, como a restauração e a indústria têm já uma grande regulamentação e um índice de tratamento do resíduo muito elevado, a fatia que corresponde à utilização doméstica ainda tem muito pouca relevância. A reciclagem de OAU ainda não é um hábito das famílias portuguesas.

Assim, o maior desafio desta indústria para os próximos anos é chegar às pessoas, às casas das pessoas, proporcionar-lhes condições para que a reciclagem não seja um grande esforço, não implique deslocarem-se quilómetros e, com isto, tornar o gesto num hábito natural, como se tornou o da reciclagem de plástico e de papel.

 

Qual a visão da EcoMovimento para a mobilidade, em Portugal, daqui a 5/10 anos?

Os próximos 10 anos serão muito importantes para percebermos o que será o futuro. Atualmente, temos muita tecnologia a ser testada e ainda pouco tempo para avaliar o contributo das energias renováveis elétricas. Daqui a uma década já teremos 20 anos bem consolidados de utilização de carros elétricos.

Neste momento, na EcoMovimento, temos algumas questões e algumas previsões, mas não queremos tomar uma posição definitiva, porque ainda há muito por vir e por conhecer.

Por exemplo, uma das questões que nos colocamos muitas vezes é se é melhor ter um carro elétrico novo ou termos um carro, com 10 anos, com um motor de combustão interna a consumir gasóleo e gasolina, mas otimizado, quer por via mecânica e eletrónica, quer pela transição dos combustíveis fósseis para os alternativos e avançados.

Isto porque, na realidade, a porta de um carro produzido em 1980, daqui a 100 anos, ainda estará em perfeitas condições para circular. Será que há necessidade de estarmos a colocar no mercado carros novos com todos os componentes que isso implica, só por causa do motor e da poupança de energia associada? Que nem sabemos se é tão grande como a que se pensa.

Estas são as questões que deixamos para os próximos 10 anos.

 

E, agora, um caso de sucesso?

Fazendo a apresentação da EcoMovimento, já estamos a apresentar o nosso caso de sucesso. Isto porque acreditamos que somos um caso de sucesso dentro da operação e gestão de resíduos, pela forma como olhamos para o setor. Somos ambientalmente conscientes, mantendo a rentabilidade necessária para o dia-a-dia de uma PME em Portugal.

A EcoMovimento acredita que é parte da solução para o devido tratamento dos óleos alimentares usados em Portugal, quer para o presente quer para o futuro. Isto porque, o nosso compromisso com este setor é o de trabalhar todos os dias para responder às suas necessidades. Por isso, estamos, neste momento, a tentar reforçar a atenção ao setor doméstico, não só porque, na nossa ótica, não está a ser devidamente trabalhado, mas porque é uma necessidade de todos os portugueses – ter um local onde possam entregar os seus resíduos para que sejam devidamente tratados.