7/29/2022

O mercado paralelo dos óleos alimentares usados

A recolha de óleos alimentares usados (OAU) é fundamental já que, quando corretamente encaminhados, estes podem ser utilizados na substituição de produtos petrolíferos nos combustíveis, provocando um impacto ambiental bastante positivo. Para fazer o correto encaminhamento dos OAU, estes devem ser colocados nos oleões disponíveis um pouco por todo o país. Os OAU são produzidos em diversos setores: canal HORECA (hotéis, restaurantes, cafés), industrial e doméstico.

Contudo, e apesar de Portugal ter já um número considerável de Operadores de Gestão de Resíduos que fazem a recolha dos OAU, os que são produzidos no setor doméstico apresentam índices de recolha bastante baixos. Isto pode dever-se ao facto de ainda existirem vários municípios que não disponibilizam uma rede de recolha para os cidadãos, contrariamente ao previsto por lei.

Neste sentido, é urgente redefinir a legislação dos OAU com o objetivo de profissionalizar o mercado da recolha e incrementar os índices de reciclagem deste resíduo. Só desta forma poderemos ter um mercado concorrencial competitivo e alcançar índices de reciclagem de OAU satisfatórios.

Por outro lado, é visível que o interesse dos consumidores pela reciclagem dos OAU tem aumentado, possivelmente como consequência da crescente comunicação e sensibilização dos municípios e dos próprios operadores.

Porém, cresce paralelamente um mercado de recolha de OAU. Isto acontece devido a diversos fatores, entre eles, o facto de a legislação do setor ser ainda demasiado permissiva. Isto é, prevê que qualquer cidadão coletado, sem qualquer tipo de licenciamento, possa recolher e transportar OAU para um Operador de Gestão de Resíduos. Denominamos esta atividade de “recolhedor de OAU” e, apesar de existirem casos de boas práticas, existem também maus exemplos – carência de limpeza, desorganização e até desvio de inúmeros litros de OAU. Estes atores põem em causa a imagem de todos os intervenientes na cadeia de valor, principalmente a dos Operadores de Gestão de Resíduos.

Por outro lado, sentimos também a falta de sensibilização e fiscalização dos produtores de OAU, já que muitos deles (do canal HORECA, por exemplo) desconhecem que são responsáveis pelo bom encaminhamento do resíduo. Além disso, os sistemas de certificação, tais como o ISCC - International Sustainability Carbon Certification, que asseguram a sustentabilidade e rastreabilidade da cadeia de valor, podem ser facilmente ludibriados por serem permissivos e estarem dependentes da boa-fé dos intervenientes.

Por fim, e talvez o fator que considero de maior gravidade, hoje em dia assistimos a Operadores de Gestão de Resíduos e Pequenos Produtores de Biodiesel que compram OAU a “produtores” e a “recolhedores de OAU” sem fatura, sem questionar a origem do mesmo e sem garantir a rastreabilidade da cadeia de valor. Enquanto estas compras ilícitas acontecerem, o mercado paralelo vai subsistir porque os OAU recolhidos indevidamente continuarão a ter um destinatário final assegurado.

Deste modo, é essencial e urgente redefinir a legislação e aumentar a fiscalização para que os OAU sejam recolhidos apenas por Operadores de Gestão de Resíduos licenciados para o efeito, e as entidades competentes reforcem os deveres dos intervenientes da cadeia de reciclagem. Só assim será possível desenhar uma estratégia para a gestão de resíduos que permita o uso dos OAU como matéria-prima para a produção de biocombustível, capaz de descarbonizar a mobilidade do presente e do futuro.