7/9/2021

RED II: O que tem sido feito e qual o impacto da sua transposição

Atingir a neutralidade carbónica é um passo fundamental para assegurar o futuro sustentável do planeta e de todos, mas é preciso ir além das campanhas à volta da sustentabilidade ambiental. Entre outros esforços, é fundamental que exista uma mudança de paradigma da economia, transitando da linear para a circular, e que se implementem algumas soluções já existentes que permitem diminuir a dependência energética de Portugal e contribuem significativamente para o cumprimento das metas europeias. Uma destas soluções é o contínuo investimento na indústria dos biocombustíveis sustentáveis, que se apresenta como uma alternativa complementar para uma rápida e justa transição energética nos transportes.

Até junho deste ano, todos os Estados-Membros devem apresentar uma proposta de transposição da Diretiva das Energias Renováveis II, já aprovada pela União Europeia. Este é o momento que definirá o caminho que Portugal quer fazer no setor dos biocombustíveis, sendo essencial ter em atenção os benefícios ambientais e económicos que estes podem trazer ao país.

 

Mas, primeiro, importa perceber o que é a RED II

A Diretiva das Energias Renováveis é um ato legislativo fundamental no quadro da política climática e energética europeu, dado que o seu propósito é promover a utilização de energia produzida através de fontes de origem renovável.

Em 2009, foi adotada a primeira Diretiva das Energias Renováveis (REDI), que definiu metas para a década de 2010 a 2020 e que levou à implementação de requisitos de sustentabilidade e de redução de emissões de gases com efeito de estufa para biocombustíveis e biolíquidos.

Nove anos mais tarde, em dezembro de 2018, a União Europeia publicou a Diretiva das Energias Renováveis II (RED II), que estabelece as metas para a presente década. Esta atualização é muito positiva para o ambiente e assinalou um ponto de viragem na validação dos biocombustíveis como parte essencial da estratégia de descarbonização dos transportes na Europa. No entanto, levanta questões no que se refere ao sistema de metas e limites estabelecido para a utilização de diferentes tipos de energias renováveis nos transportes.

Está, por isso, nas mãos de cada Estado-Membro definir metas próprias mais ambiciosas, o que permite a Portugal mostrar essa ambição e ir além das metas definidas pela RED II – caso contrário, seria uma regressão no trabalho desenvolvido até hoje.

 

O impacto da transição

A Diretiva das Energias Renováveis atualizada prevê a continuação e reforço dos incentivos a todos os biocombustíveis sustentáveis, mas importa analisar as medidas previstas e as suas implicações.

Metas ambiciosas

A incorporação de energia renovável no setor dos transportes é essencial para o cumprimento das metas europeias, no entanto, as metas previstas pela RED II representam recuos no panorama nacional.

Enquanto Portugal estabeleceu, no seu Plano Nacional de Energia e Clima, a meta de 20% de incorporação mínima de energia renovável no consumo final de energia nos transportes para 2030, a RED II definiu em 14% a quota mínima. A transposição desta medida representaria perdas no potencial da indústria nacional e um retrocesso para Portugal.

Num caso mais particular, a incorporação dos biocombustíveis avançados e de biogás, produzidos a partir de matérias-primas do anexo IX parte A, a Diretiva define que a meta deve ser de pelo menos 0,2% em 2022, pelo menos1% em 2025, e de, pelo menos, 3,5% em 2030. No entanto, tendo em conta a urgência climática, Portugal, em 2020, estabeleceu em 0,5% a meta de incorporação de biocombustíveis em teor energético, impulsionando mudanças significativas. Se já concretizámos esta meta, porque não incentivar metas ambiciosas para os biocombustíveis avançados no futuro?

Regras de cálculo das quotas mínimas de energia renovável no setor dos transportes

Quanto às regras de cálculo relativas às quotas mínimas de energia renovável no setor dos transportes, a Diretiva sugere que deve ser tido em conta o teor energético de todos os tipos de energia de fontes renováveis para todos os setores de transportes. No entanto, é importante reforçar que Portugal deve considerar os combustíveis de carbono reciclado para todos os transportes, incluindo o transporte marítimo.

Em relação aos biocombustíveis sustentáveis, a RED II prevê a continuação e reforço dos incentivos, mas afirma que a quota dos biocombustíveis sustentáveis deve ser limitada a 1,7% do teor energético dos combustíveis para transportes destinados ao consumo ou utilização no mercado. Este limite representa um retrocesso muito significativo na transição energética, uma vez que, em Portugal, a integração dos biocombustíveis sustentáveis já se situa acima dos3% e a tendência deve ser de crescimento. Assim, a isenção do CAP deve fazer parte da estratégia nacional para a contínua evolução do setor, tal como definido no seu Plano Nacional de Energia e Clima 2030.

Atualmente, em Portugal, mais de 60% dos biocombustíveis produzidos, são biocombustíveis sustentáveis produzidos a partir de matéria-prima residual, sendo sujeitos ao regime de dupla contagem. A manutenção do regime de dupla contagem, é fundamental para efeitos de demonstração do cumprimento das quotas mínimas de incorporação de biocombustíveis sustentáveis. Este é o principal mecanismo de promoção de políticas que garantem a presença de biocombustíveis produzidos a partir de matérias-primas residuais, tendo sido uma ferramenta muito eficaz na garantia de recolha, tratamento e transformação de biocombustíveis, que reduzem significativamente a emissão de gases com efeito de estufa.

 

A transposição destas metas e destas atualizações para o panorama nacional coloca em risco os objetivos de transição energética e a indústria nacional, que tanto tem investido no desenvolvimento tecnológico que permite ir mais longe no corrida pela a neutralidade carbónica. Contudo, a RED II traz também novas medidas no sentido de desenvolver a estratégia energética para os transportes.

O setor da energia está em constante mudança. Todos os dias se desenvolvem novas soluções e, por isso, o trabalho nesta matéria é constante e contínuo. Tanto que, enquanto decorre a transposição para o contexto nacional, o Green Deal (Pacto Ecológico Europeu), já está a ter um papel fundamental no impulsionamento da utilização eficiente dos recursos através da transição para uma economia limpa e circular, no restauro da biodiversidade e na redução da poluição.